DIA DE PROVA 
 

(Publicada em 9 de outubro de 1.999) 

Minha capacidade de concentração nunca foi fenomenal, mas não é das piores. Nunca tive problema para estudar ouvindo música ou ler uma apostila dentro de um ônibus. Até um dia desses eu achava que barulho não me atrapalhava mesmo a me concentrar num estudo ou na feitura de uma prova. Engano.

Era uma noite de quarta. Noite quente, sem vento nem brisa. A sala estava lotada e a prova era trabalhosa, longa, exigia que se escrevesse muito. Comecei a responder as questões. Um barulho ou outro, como é comum, acontecia. De vez em quando alguém batia na porta da sala, causando a reclamação de alguns. Por mim, tudo bem. Entre um barulhinho e outro, nada demais. Os papéis em que a prova foi impressa produziam seu ruído típico quando manejados. Daqueles que estavam mais perto eu podia escutar a borracha sendo usada. Tudo parecia ser mais um trivial dia de prova.

De modo incomum, o professor me pediu para sentar no fundo da sala. Fui. Nem a primeira questão da prova havia sido resolvida, comecei a ouvir um barulho. Vinha de um colega que estava na fileira a meu lado, a minha direita. Era o barulho de uma embalagem que parecia ser de plástico. A embalagem estava no bolso dele. Em espaços compassados ele, com a mão esquerda, ia até o bolso esquerdo da camisa, pegava algo lá dentro – momento em que fazia o barulho – e colocava qualquer coisa na boca. Pensei se tratar de amendoim, depois pensei que pudesse ser algum tipo de bala... De qualquer modo, já que o barulho estavam me incomodando, atrapalhando-me, decidi tentar relaxar, na crença de que em pouco tempo as balas ou sei lá o quê acabariam. Ilusão.

Eu já não sabia mais o que fazer. Ele movia a mão, colocava-a no bolso (argh!), remexia e retirava o produto. O que pensei que duraria alguns minutos não acabava mais. Quando eu percebia que ele estava mastigando, aproveitava para tentar raciocinar. Nem um minuto se passava e ele reiniciava os movimentos fatídicos. Aquilo foi me irritando. O tempo ia passando e eu não conseguia deixar de me sentir incomodado. Cheguei ao ponto de prestar mais atenção no banquete dele do que em minha prova. Eu já estava praticamente marcando o intervalo de tempo entre uma retirada de mercadoria do bolso e outra.

Armado-me com olhares os mais ríspidos possíveis, eu tentava fazer com que ele percebesse minha indignação. Se percebeu, não deu a mínima. Bolso sem fundo não existe, mas que bolso gigantesco era aquele? E o que havia na embalagem de plástico que não acabava mais? Quando meu desespero já não suportava mais se calar, ele acabou.

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