Era uma
noite sem estrelas.
Minha mãe, meu
irmão e eu estávamos
na casa de uma tia minha.
Ao chegar a hora de
irmos embora, lembro-me
que recebemos de minha
tia a orientação
de voltarmos para casa
o mais rápido
possível. Caso
contrário, correríamos
risco de vida. Entregou
um embrulho à
minha mãe, despedimo-nos
rápido e pusemo-nos
a caminho de casa.
Andamos
poucos metros e logo
perguntei para minha
mãe o que estava
embrulhado naquele jornal.
Se ela respondeu, não
me lembro. Em seguida,
perguntei-lhe o motivo
pelo qual era necessário
estarmos em casa tão
rapidamente, e ela disse
que em pouco tempo alguns
vaqueiros estariam percorrendo
as ruas da cidade, e
se encontrassem alguém
fora de sua casa, a
pessoa seria morta por
eles. Segundo ela, estariam
conduzindo uma manada.
Quem ousasse ficar nas
ruas, poderia também
ser pisoteado pelos
animais. Ou da manada
ou dos vaqueiros não
se escaparia.
Tanto
me assustou o relato
que, apesar de meus
quatro ou cinco anos,
eu me vi puxando minha
mãe, quase que
a obrigando a correr;
ela, por sua vez, puxando
meu irmão. De
nada adiantava ela tentar
me acalmar, afirmando
que tínhamos
tempo o bastante para
que chegássemos
vivos em casa. Eu só
queria correr, estar
em minha casa, estar
vivo. Logo me cansei,
mas a gana de me sentir
seguro era maior. Corri
muito, fiz com que corressem
muito.
Vislumbrei
nossa casa. Faltava
uma esquina para que
lá chegássemos.
Foi então maior
o meu ímpeto.
Melhor escrevendo, meu
desespero. As ruas desertas,
a noite escura. Já
havíamos caminhado
uns quinze minutos.
Só de imaginar
que os vaqueiros poderiam
surgir, vindos de uma
outra esquina, consegui
impor ainda mais ritmo
à nossa pressa.
Chegamos, abrimos o
portão e entramos.
Estávamos vivos.
Dez minutos depois,
os vaqueiros. Observamos
pela janela semiaberta
a algazarra que faziam.
Gritavam muito. Com
grande alvoroço
conduziam a manada.
Muitos
anos se passaram, e
um dia perguntei para
minha mãe se
ela se lembrava daquele
dia tenebroso. Ela disse
que não, concluindo
que provavelmente a
história teria
sido sonho meu. Perguntei
para meu irmão.
Ele também não
se lembrava. Fiquei
intrigado. Afinal, tudo
parecia tão real.
Será que tudo
foi um sonho? Mas foi
tão verdadeiro!
E é estranho,
pois, mesmo hoje, estando
eu com vinte e cinco
anos, aquela noite me
parece imensamente real.