CAÇA-PALAVRAS 
 

(Publicada em 17 de novembro de 1.997) 

A etimologia aproxima as palavras porque nos conduz à sua essência. Essencialmente, muitas palavras guardam semelhanças univitelinas. Isso une muitas delas; pode-se colocar inúmeras delas num só saco. Outras virão, com suas essências devidamente escarafunchadas. Vão se entender com as outras, já essencializadas. Algumas uniões, a princípio, causarão estranheza, soarão inconcebíveis. Com o passar do tempo, serão legitimadas. No fim, tudo se torna farinha do mesmo saco.

Tenho pensado muito nas palavras e, por extensão, naqueles que as utilizam com afinco. Joyce tem me ocorrido freqüentemente; mais freqüentemente como nunca, por ter eu conseguido trechos do “Ulisses” no original; mais freqüentemente do que nunca, após eu ler que no “Finnegans Wake” há a invenção de palavras por intermédio do conhecimento de idiomas. (Guimarães Rosa não ficava atrás.) (A Universidade de Poesia dos sonhos de W.H. Auden apresentaria em seu currículo também o seguinte: “Além do estudo da língua inglesa (ele ira inglês), seria obrigatório o estudo de pelo menos uma língua antiga, provavelmente grego ou hebraico, e de dois idiomas modernos”.)

A palavra só se revela após o labor. A busca da essência-palavra para jogar luz sobre o homem-enigma. Decifrar-se pela palavra. Decifrando a palavra, o homem se decifra. Ousar a palavra é um meio de sair de si próprio só para ir-se indo cada vez mais ao encontro de si mesmo. Um meio de sair-entrar-se (não necessariamente nessa ordem). Apenas um. Não vale mais nem menos do que outros. Quem ousa um meio tem algum caminho andado.

As palavras me fazem amar o mundo, e um dos primeiros autores a me fazer amar as palavras foi Carlos Drummond de Andrade. Um cara inteligente; era essa a impressão que ele me deixava. Deixa. Uma das vezes em que eu mais ri foi após ler um poema de Drummond, um que ele colocou no papel a precisão de escrever algo sobre a Bahia, mas o problema era que ele nunca tinha ido lá. Anos se passaram. Numa bela leitura, Auden me explicou uma das razões de eu tanto gostar de Drummond: “Não encontro um denominador comum entre as pessoas de que gosto ou que admiro, mas entre as que amo: todas me fazem rir”.

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