O MUNDO DÁ VOLTAS 

 

(Publicada em 16 de agosto de 1.996) 

Lembro-me muito bem. Era uma noite de sábado. A primeira vez em que a vi foi numa festa. Ela chegou; alta, morena. Passou pela soleira e tropeçou no tapete. Pareceu-me que cairia, mas não caiu. Ao se recompor, seus olhos depararam os meus. Senti-me aliviado pelo fato de ela não ter caído, e ela, como que percebendo meu alívio, sorriu timidamente.

Por falar em timidez, logo logo tive a impressão de que essa era uma das principais características da garota. Falava pouco, gestos contidos. Num determinado momento da festa, estando ela a conversar com uma amiga minha, aproximei-me das duas, criando então a primeira oportunidade de falar com ela, o que foi muito aprazível. Como ela não estava bebendo nada, ofereci-lhe cerveja. Recusou, pedindo-me para buscar refrigerante. Ao voltar, mais uma pessoa já havia se integrado à rodinha. Em um instante, e já éramos seis. Decidi dar um giro pela casa, mas ainda me sentindo atraído por ela.

A festa prosseguia animada, e eu pensando na garota. Cercado de pessoas, bebidas e comidas, eu ia meditando uma maneira de manter contato com ela numa outra ocasião. A possibilidade de acompanhá-la até sua casa era remota. Ela poderia morar muito longe; não tenho carro nem moto. De vez em quando nossos olhares se encontravam.

Esperançosamente eu tentava perceber em seu olhar castanho-claro algum possível interesse dela por mim. O tempo passava e comecei a temer que a qualquer momento ela poderia ir embora. Eu tinha de dar-lhe o número de meu telefone, ou mesmo conseguir o dela, quem sabe. Teria de me reaproximar, torcer para que ficássemos algum tempo conversando sem que nova rodinha se formasse. Peguei papel e caneta; quando ia já escrevendo meu nome e número de meu telefone, tive a idéia de escrever para ela um poema. Escrevi, assinei, deixei o número no papel e o coloquei no bolso da camisa. Em dois ou três minutos reaproximei-me e entreguei-lhe o pedaço de papel dobrado. Ela não me ligou, situação que lamentei duplamente: nem eu nem o poema fomos o bastante para convencê-la a ligar. Uma pena. Afinal, eu achara bem-escrito, e dele não tenho cópia.

Voltando às aulas, entrei animado na sala. Comecinho do ano letivo. Hoje ela é minha aluna.

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