Desesperado.
O termo ideal é
esse. Eu não
tinha a menor idéia
sobre o que eu escreveria
para a coluna do jornal.
Fiquei uma semana inteira
pensando sobre algum
assunto que poderia
vir a ser abordado.
Eu saía pelas
ruas, olhava em torno,
olhava as pessoas, apelava
para a memória.
Tudo em vão.
Em meu quarto, eu adotava
o mesmo procedimento.
Novamente, nada. Os
dias iam se passando
e nenhuma palavra eu
esboçava. Em
tais momentos, penso
em pendurar as chuteiras,
ainda praticamente novas.
Fico pensando na tarefa
daqueles que têm
de escrever uma crônica
por dia; como teste,
já pensei em
tentar escrever uma
crônica todo dia;
nesse caso, não
basta talento e/ou inspiração.
Há muito de braçal
envolvido. Há
disciplina. É
algo maquinal.
Já
era madrugada de sexta-feira,
dia 24 de outubro de
1.997. Eram mais ou
menos quatro da manhã,
e eu terminara de ler
“Ana Karênina”.
Procurei ler o livro
o mais rapidamente possível,
para acompanhar a exibição
do filme, que está
em cartaz no Riviera.
Fui lendo, lendo, lendo
e me envolvi. Mesmo
tendo de acordar logo
pela manhã, eu
não conseguia
parar de ler. Tinha
de saber o fim da história,
tinha de terminar a
leitura para fazer aquelas
comparações
que fazemos quando vemos
um filme baseado num
livro. Assim que li
a última frase,
tudo se tornara claro.
Terminada a leitura,
percebi que minha dificuldade
em conseguir assunto
para minha crônica
chegara ao fim. Num
relance, tive a grata
revelação
de que eu estava sentindo
a mais genuína
saudade de todos os
personagens do livro.
Quando as páginas
se acabaram, todos aqueles
personagens eram por
mim queridos. Durante
a leitura, não
me dera conta de tal
envolvimento.
Há
no livro um tal de Lvov.
Ele é casado
com uma tal de Natália.
O nome Lvov tem letras
em comum com o nome
Lívio. O nome
de minha namorada é
Natália. (Não
faço aqui um
pedido de casamento;
apenas relato uma coincidência,
ou o que achei ser uma
coincidência.)
Há no livro um
tal de Sérgio.
A irmã de Natália
é casada com
um cara chamado Sérgio.
Deixando
de lado essas digressões,
voltemos à saudade,
o ato de lembrar coisas
agradáveis. Melhor
é tê-la;
passar em branco é
que deve ser terrível.
A dor da saudade é
bem melhor de ser sentida
do que a dor do vazio.
Quero a dor da saudade,
quero ampliar os espaços
de meu coração
para inserir mais saudade,
pois para se sentir
saudade, primeiro é
preciso inserir vida.