"UMA BREVE HISTÓRIA DO TEMPO" 

 

(Publicada em 3 de janeiro de 1.997) 

"O tempo passa sem que o sinta a gente".

A frase de Dante (1.265-1321) parece ter sido escrita ontem. Há uma canção da banda gaúcha Nenhum de Nós chamada “Sobre o Tempo”. O Pato Fu tem uma canção com o mesmo título. O Pink Floyd tem uma chamada “Time”, também o nome da famosa revista. Há o tempo de Proust, que assim inicia, segundo a tradução de Mário Quintana, sua obra “Du Côté de chez Swann”: “Durante muito tempo, costumava deitar-me cedo”. Em Thomas Mann, segundo a tradução de Herbert Caro, no livro “A Montanha Mágica”, há o seguinte trecho: “Pode-se narrar o tempo, o próprio tempo, o tempo como tal e em si?”. De acordo com Einstein, “o tempo é relativo e não pode ser medido exatamente do mesmo modo e por toda a parte”. No Eclesiastes está escrito: “Tudo o que existe debaixo dos céus tem o seu tempo”.

Todo esse papo sobre o tempo fez com que eu me lembrasse de uma frase dita por um locutor da rádio Bandeirantes, chamado Valmir Jorge: “O tempo passa e a gente nem vê”. A frase simples, dita por ele quando o mesmo fazia um programa de madrugada, me marcou, sem que eu saiba a razão pela qual jamais me esqueci dela. Eu era, na época, ouvinte assíduo do programa dele, por admirar muito o trabalho de Valmir Jorge. Quando ouvi pelo rádio a frase já mencionada, cheguei a repeti-la em voz alta, enquanto pensava sobre ela. “O tempo passa e a gente nem vê”. Ela continua atuando em mim. Quanto mais o tempo passa, mais significativa ela vai se tornando.

Aos onze anos consegui meu primeiro emprego. Trabalhava numa fábrica que empacota farinha e fubá. Trabalhei lá por muito tempo. Quatro anos ou mais. E trabalhava o tempo todo com o rádio ligado, ouvindo música o dia inteirinho. Os colegas de trabalho também gostavam, e de vez em quando até arriscávamos cantar algumas delas. Foi nessa época que comecei a perceber como sou desafinado. Foi nessa época que comecei a me interessar pela história das bandas, comecei a ler sobre música.

Uma canção muito executada, recordo-me, era aquela “Muito Estranho”, cantada pelo Dalto. Se alguém quisesse ouvi-la, bastava ligar o rádio que lá estaria ele cantando o famoso refrão “Cuida bem de mim”. Como não podia deixar de ser, o tempo foi passando, passando, até o dia em que eu não mais trabalharia lá. Consegui um outro emprego, saí dele, fui para um outro, depois para um outro e assim por diante. Enquanto isso, eu via gente crescer. Hoje, muitas meninas que eu tenho visto desde quando eram bebês, estão crescidas, viraram mulher. (Alguém aí se lembrou do Paulinho Nogueira?)

Desse monte de gente que vi nascer e crescer, há um menino que hoje é maior do que eu. O nome dele é Edgard, e ele é meu irmão. Hoje em dia, quando o observo, penso que os pais devem sentir algo similar quando reparam em seus rebentos.

Há uns quinze dias o Edgard me telefonou, enquanto eu trabalhava, para me pedir a música “Muito Estranho”. O ano passa e a gente nem vê. “Pois mil anos, aos olhos de Deus, são como o dia de ontem que se foi”.

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