Em 1.987
lecionei pela primeira
vez. Foi em Carmo do
Paranaíba. Lá,
trabalhei durante um
ano. Fiquei algum tempo
parado e depois lecionei
novamente, dessa vez
aqui em Patos de Minas.
Novamente parei. No
ano passado, a partir
de agosto, voltei a
lecionar. E assim tem
sido desde então.
Freqüentemente
penso que as histórias
ocorridas em sala de
aula são material
farto. As sutilezas,
os olhares, as desavenças,
as dúvidas ou
as explicações.
Qualquer aula de cinqüenta
minutos em qualquer
escola daria um livro.
Há
algum tempo fiz com
que uma história
ocorrida em sala de
aula virasse crônica.
Escrevi na ocasião
sobre um desentendimento
entre uma aluna e mim.
Passou-se o tempo e
novamente uma história
ocorrida numa sala de
aula tem convivido comigo.
De duas semanas para
cá, nela tenho
pensado com freqüência,
a ponto de contá-la
agora.
Era o
terceiro horário.
Explicada a matéria,
e ainda faltando cinco
ou sete minutos para
bater o sinal, ficamos,
eu e os alunos, a conversar
sobre amenidades. Eu
conversava um pouquinho
com um, um pouquinho
com outro, e o tempo
ia passando. Impacientes,
eles me pediam a todo
instante para que eu
os liberasse, pois queriam
entrar na fila do barzinho
antes de se iniciar
o recreio. Até
hoje não parecem
convencidos de que o
fato de eu não
liberá-los não
é uma escolha
minha: estou cumprindo
ordens. Quando os mais
afoitos já estavam
de pé à
porta, prontos para
pegar a fila, bateu
o sinal.
Peguei
meu material; quando
já ia me dirigindo
rumo à porta,
uma aluna aproximou-se
timidamente. Aluna discreta,
dessas que ficamos toda
uma aula sem conhecer
a cor de sua voz. (Não
me lembro se ela tira
notas boas, mas sei
que em sala de aula
ela fala muito pouco.)
Ela se aproximou e me
perguntou num tom suave
se eu me lembrava de
certa vez ter dito em
sala de aula que eu
não conhecia
ninguém normal
ou que tivesse paz.
Surpreso, respondi que
me lembrava de já
ter dito algo mais ou
menos assim, e confirmei
que eu não me
lembrava do contexto
em que fizera tal afirmação.
Ela, muito sem jeito,
disse-me que jamais
conhecera alguém
normal, mas que paz
ela tem.
Fiquei
surpreso, muito surpreso.
Ela demorou para me
falar da paz que sente,
e sobre isso conversamos
durante o recreio. Aquela
garota tímida
e discreta me surpreendeu
com sua inteligência,
maturidade e... paz.
E posso estar errado,
mas ela parecia querer
me ajudar. E ajudou.
Resta-me desejar a ela
o bem, desejar a ela
sabedoria. Que a paz
seja com ela.
E vou
passar a observá-la
em sala de aula.